Apesar de variar muito de acordo com o tipo de projeto e o tamanho do edifício, a quantidade de aço usada na construção civil é sempre muito importante, podendo representar entre 15 e 35% de todo o material usado em uma obra. Embora essa não seja uma novidade, o setor está preocupado com outro número atualmente: junto com o concreto, o ciclo de aplicação do aço é responsável por cerca de 80% da emissão de dióxido de carbono – ou CO2, uma das substâncias mais poluentes para o meio ambiente – no período da construção.

O dado foi apresentado pelo professor Ricardo Leopoldo e Silva França, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), durante a 14ª edição do Concrete Show, que aconteceu entre os dias 8 a 10 de agosto no São Paulo Expo. Atualmente ele é diretor na França e Associados Projetos Estruturais, mas retornou para o departamento de Estruturas e Geotecnia da Poli para trabalhar na área de Sustentabilidade. Segundo ele, todas as pesquisas conduzidas são no sentido de estruturas mais enxutas para a construção civil, em que o engenheiro de estruturas e o projetista de arquitetura trabalhem mais proximamente.

“Se há décadas já existem estudos e trabalhos para o controle de gastos em água e energia durante a vida útil de um prédio, agora devemos pensar também no momento da construção. Onde podemos agir no sentido de baixar as emissões de CO2 das nossas construções? No projeto. Diminuindo as quantidades de materiais, descobrindo como fazer obras mais enxutas e desenvolver materiais mais eficientes, valorizando o uso dessas versões nos projetos”, afirmou o professor França.

Investimentos em busca da neutralidade de carbono

A USP tem parceria com a ArcelorMittal, uma das maiores produtoras de aço do mundo, através da Cátedra Construindo o Amanhã, que une acadêmicos e executivos da área de Inovação e Desenvolvimento de Produtos para Construção Civil da empresa. Uma das tecnologias mais estudadas por essa iniciativa é o CA-70, um novo tipo de aço estrutural de alta resistência que tem sido usado internacionalmente nos setores de infraestrutura e construção civil, uma vez que oferece ganhos em produtividade e sustentabilidade.

O engenheiro de Projetos da ArcelorMittal, Michell Ribeiro, também participou do painel “Soluções em Aço para Estruturas de Concreto Armado de Baixa Pegada de Carbono” durante o Concrete Show, e revelou que a meta global da companhia é reduzir em 25% as emissões de dióxido de carbono em todos os seus processos até 2030, e atingir a neutralidade até 2050. Para isso, a empresa terá um investimento de US$10 bilhões.

“A ArcelorMittal já está focada há bastante tempo nessa questão de sustentabilidade, desde 1999 quando conseguimos o nosso primeiro Certificado Ambiental. Mesmo o nosso aço convencional já oferece uma pegada de carbono inferior do que a média dos produtos no Brasil, e em 2019 lançamos uma metodologia em que trabalhamos junto com os projetistas, pensando a melhor solução para a obra inteira desde a fundação. A intenção é diminuir os custos, aumentar a produtividade e diminuir os impactos ambientais”, disse Michell Ribeiro.

Experiências com uso do aço CA-70 no Brasil

Quem deu um exemplo prático da aplicação do aço CA-70 no Brasil foi o professor Sebastião Salvador, do departamento de Engenharia de Estruturas da Universidade Federal de Minas Gerais, que mostrou a reforma de um viaduto naquele estado que contou com sua consultoria. O professor chamou atenção para a falta de uma norma técnica que regule o aço CA-70 para uso geral no país, mas lembrou que enquanto os estudos são feitos, o projetista pode se apropriar de normas internacionais.

“No caso deste viaduto, nos sentimos confortáveis para utilizar o aço CA-70 por três razões: o diagrama de tensão e deformação era conhecido, já existiam ensaios preliminares de aderência e ancoragem, e por se tratar de uma ponte rodoviária, em que a variação de tensão ao longo da vida útil da obra era relativamente pequena”, explicou Sebastião Salvador.

O proprietário da AS Estruturas, Aurélio Franceschi, concorda que o uso mais amplo do aço CA-70 ainda depende da capacitação de profissionais e projetistas para que o cliente se sinta seguro em aplicar o material, e esse processo só irá começar quando a Associação Brasileira de Normas Técnicas criar regras completas e consistentes para a prática.

“Um produto só consegue ir para frente se ele se popularizar. Veja o concreto protendido com cordoalhas, por exemplo, ele surgiu quando eu comecei a trabalhar com projetos, em 1987. Fui para os Estados Unidos, aprendi a trabalhar com cordoalhas engraxadas, mas os nossos clientes não queriam fazer. Primeiro porque não havia norma, e também porque poucos projetistas faziam, havia poucos fornecedores e aplicadores. Foi um processo que durou 30 anos para que hoje o concreto protendido com cordoalhas engraxadas tenha se tornado o sistema corrente”, lembrou Aurélio Franceschi.