O mercado de carbono vem ganhando espaço como uma ferramenta essencial na busca por uma economia mais sustentável – e o setor da construção civil tem papel central nesse processo.

Com o desafio de reduzir as emissões dos gases de efeito estufa (GEE) em cadeias produtivas intensivas, como as do aço e do concreto, empresas do ramo começam a enxergar nos créditos de carbono não apenas uma exigência ambiental, mas uma oportunidade estratégica.

Neste artigo, Michelle Guersoni de Lima Nespoli, engenheira ambiental e gerente de ESG para a América Latina na Sika S.A explica o funcionamento do mercado de carbono, os impactos na construção civil e quais práticas podem transformar as emissões em diferencial competitivo para o setor. Confira!

Mercado de carbono: o que é e qual a importância para a construção civil

Michelle Nespoli inicia a conversa explicando que o mercado de carbono consiste na compra e venda de créditos de carbono, que representam o direito de emitir uma quantidade específica de gases de efeito estufa. 

Logo, este mercado tem se tornado cada vez mais relevante nos setores de aço e concreto, impulsionado pela crescente demanda por soluções sustentáveis e pela necessidade de reduzir as emissões dos GEE.

“Tais setores buscam alternativas e tecnologias mais limpas para se adequarem às novas exigências do mercado e evitar custos com créditos de carbono”, ressalta.

Estratégias para reduzir a pegada de carbono na produção do concreto e do aço

O setor do aço, segundo a entrevistada, contém processos de produção que envolvem altas temperaturas e o uso de combustíveis fósseis, o que torna a redução das emissões dos gases de efeito estufa muito desafiadora.

“Atualmente, a indústria está investindo em tecnologias de baixo carbono, como o desenvolvimento de aços de alta resistência, que permitem a redução de material na construção e, consequentemente, a diminuição da pegada de carbono”, observa.

“Inclusive, a busca por fontes de energia renovável e o uso de processos de produção mais eficientes são outras estratégias adotadas pelo setor”, cita.

Já a cadeia do concreto, de acordo com Nespoli, é um grande consumidor de cimento, que é um dos principais emissores de carbono na construção civil.

“Para reduzir as emissões, o setor está explorando o uso de cimentos com menor teor de carbono, concretos com adições de resíduos industriais e materiais reciclados, além de otimizar o projeto de estruturas para reduzir a quantidade de concreto necessária”

“A implementação de práticas de construção sustentável, como a utilização de tecnologias de construção pré-fabricadas e a adoção de projetos que priorizem a durabilidade e eficiência energética dos edifícios, também contribui para a redução da pegada de carbono do setor”, acrescenta.

Materiais alternativos ou tecnologias mais eficientes para a geração de créditos de carbono

Na opinião da especialista, a geração de créditos de carbono nos setores de aço e concreto pode ocorrer por meio de projetos que visam a redução ou a compensação das emissões dos gases de efeito estufa.

“Isso pode ser alcançado com a implementação de tecnologias mais limpas, o uso de materiais reciclados e a otimização de processos produtivos”, aconselha.

Barreiras regulatórias e operacionais no mercado de carbono

A engenheira ambiental acredita que o setor da construção ainda não esteja totalmente preparado para esta mudança. Contudo, ela vê oportunidades para monetização via mercado de carbono, especialmente no médio e longo prazo, à medida que a regulação evolui. “As empresas que se anteciparem nesse processo tendem a colher vantagens competitivas”.

“Em relação à questão regulatória existe uma dificuldade devido a ausência de padronização clara sobre como projetos de construção devem contabilizar suas emissões e gerar créditos. Além disso, a burocracia e o custo de certificação trazem limitações para este processo”, analisa.

Monitoramento das emissões de forma confiável para participar do mercado voluntário ou regulado de carbono

Para conseguir medir as emissões de forma confiável, Michelle afirma que a empresa deve seguir uma metodologia de elaboração de inventário que seja reconhecida, como o GHG Protocol, por exemplo.

“Após seguir a metodologia é desejável a contratação de uma auditoria que possa validar os dados do inventário de emissões de GEE”, orienta.

O mercado de carbono como um diferencial competitivo para empresas da construção civil

Na opinião da entrevistada, o mercado de carbono pode com certeza se tornar um diferencial competitivo para as empresas do setor da construção civil.

“Especialmente devido ao atual cenário de transição para uma economia de baixo carbono em que existe um aumento da pressão por práticas de ESG (ambientais, sociais e de governança) por parte de investidores, consumidores e stakeholders de modo geral”, presume.

As obras com baixa pegada de carbono, segundo Nespoli, ganham preferência em licitações públicas e contratos corporativos, do mesmo modo que projetos certificados ou que geram créditos de carbono têm acesso mais fácil a financiamentos verdes. “Cabe ressaltar que a adoção de práticas sustentáveis (como eficiência energética, redução de desperdício e reaproveitamento de materiais) pode baixar custos e aumentar a produtividade”, finaliza.