Pense em uma indústria da construção onde nada é desperdiçado e cada material retorna ao processo produtivo com novo valor. Parece interessante, não é mesmo?

Esse é o princípio da economia circular na cadeia do concreto, que tem ganhado destaque com práticas como o reaproveitamento de resíduos, a adoção de um ciclo fechado de produção, a implementação de logística reversa eficiente e o uso crescente de concreto reciclado.

Mais do que uma tendência sustentável, trata-se de uma mudança estratégica que reduz impactos ambientais, otimiza recursos e estimula a inovação no setor.

Para aprofundar esse tema essencial, continue conosco e confira a entrevista que fizemos com Laís Ehlert Martini, tutora do Técnico em Design de Interiores do Senac EAD. Veja mais do que ela nos disse a seguir!

A economia circular e a cadeia do concreto

Na construção civil, o concreto desempenha um papel fundamental na execução de obras, sendo o material mais utilizado no setor e estando presente em praticamente todas as etapas do desenvolvimento urbano.

“Pesquisas apontam que o concreto é o material mais consumido globalmente no setor da construção civil”, inicia Laís Martini.

“O grande desafio é que, embora seja essencial para o funcionamento do setor, a sua produção gera impactos ambientais significativos, já que está associada a elevados volumes de resíduos e à emissão de CO2”, explica a entrevistada.

Diante desse cenário e dos impactos ambientais globais, como as mudanças climáticas, torna-se indispensável adotar estratégias que minimizem tais efeitos negativos.

Nesse contexto, a economia circular surge como uma alternativa promissora para o setor, oferecendo caminhos para um uso mais consciente e eficiente dos recursos.

“A economia circular é um modelo econômico que busca repensar e romper o ciclo linear tradicional que é extrair → produzir → consumir → descartar, propondo, em seu lugar, um fluxo contínuo de aproveitamento dos recursos, no qual os resíduos passam a ser tratados como insumos para novos processos produtivos”, ressalta.

Aplicação do conceito no setor construtivo

No setor da construção civil, o conceito de economia circular pode ser aplicado de diferentes formas, com o objetivo de estabelecer um ciclo mais racional no uso dos recursos que compõem a cadeia do concreto.

Entre as possibilidades, Laís Martini cita:

“O reaproveitamento de resíduos, como entulhos de demolição, que podem ser processados e utilizados como agregados reciclados na produção de novos concretos ou em bases de construção, incluindo camadas de pavimentação, blocos de vedação e elementos pré-moldados”.

Associada a essa prática, a logística reversa desempenha um papel estratégico, permitindo que as empresas especializadas realizem a coleta de resíduos de concreto diretamente nos canteiros de obras, reinserindo-os no ciclo produtivo em cadeias locais ou regionais.

“Essa abordagem incentiva a reciclagem, reduz custos de transporte e minimiza impactos ambientais”, comenta.

Conforme Martini, na fase de projeto, torna-se essencial adotar um planejamento inteligente e digital, capaz de revisar o consumo de concreto em todas as etapas de execução, reduzindo desperdícios.

“Esse processo pode ser monitorado por meio da Análise do Ciclo de Vida (LCA), ferramenta que avalia impactos ambientais e subsidia decisões mais eficientes”, orienta.

“Além disso, em casos de estruturas temporárias, recomenda-se o uso de sistemas modulares pré-moldados, que podem ser desmontados e reaproveitados em novas obras, evitando a necessidade de demolição”, complementa.

Essas ações, segundo a especialista, oferecem benefícios diretos em 3 dimensões: ambiental, econômica e social.

“Dessa forma, a economia circular aplicada ao concreto busca transformar resíduos em recursos, reduzir a dependência de matérias-primas virgens e planejar o ciclo de vida completo das construções em concreto, com vistas à minimização de desperdícios e à promoção da sustentabilidade no setor”, observa.

COP30: insights sobre essa nova mentalidade

A COP30, que em 2025 será realizada em Belém, no Pará, representa um marco relevante nas discussões globais sobre as mudanças climáticas.

“A sustentabilidade nas decisões relacionadas à construção civil configura-se como um tema urgente, capaz de definir o futuro da urbanização em consonância com a preservação ambiental”, opina a professora.

Nesse contexto, Laís Martini vê o evento como uma oportunidade de insights valiosos para acelerar a transição dos processos construtivos atuais em direção à economia circular.

“Espera-se, portanto, que a COP30 proporcione um espaço estratégico para que o setor da construção civil discuta soluções concretas de sustentabilidade com foco na formulação de normas e políticas públicas que permitam à área assumir um papel de protagonismo na transição climática”, considera.

Mudanças que devem ocorrer na sustentabilidade da construção

A sustentabilidade na construção civil constitui uma pauta urgente e deverá passar por transformações significativas ao longo dos próximos anos, a fim de tornar o setor mais sustentável e resiliente.

“Entre as transformações esperadas, destaca-se a ampliação do uso de materiais sustentáveis e inovadores, como o concreto reciclado, os tijolos ecológicos e a madeira certificada, além da incorporação de insumos de baixo carbono, como o cimento reciclado”, analisa a entrevistada.

Outro ponto relevante, na visão de Laís Martini, é a expansão do uso de fontes renováveis de energia, com vistas a promover maior eficiência energética no ambiente urbano.

“Isso pode ser alcançado por meio da energia solar fotovoltaica, de equipamentos de alta eficiência e de sistemas de automação voltados ao controle inteligente do consumo”, cita.

“Nesse contexto, as edificações de energia quase zero (NZEB) configuram-se como uma alternativa promissora, cuja adoção tende a se expandir nas próximas décadas”, exemplifica.

Ela lembra, ainda, da necessidade de gestão inteligente da água, com soluções de captação de águas pluviais e tratamento de águas cinzas para reuso, evitando desperdícios.

“A digitalização também se apresenta como aliada estratégica, que permite prever impactos ambientais e reduzir desperdícios, além de possibilitar simulações energéticas e de ciclo de vida (LCA) já na fase de projeto”, comenta.

Para a tutora do Senac, o fortalecimento da economia circular em escala é igualmente essencial, com foco na logística reversa de resíduos de obra e no reuso de componentes construtivos, contribuindo para o desenvolvimento de cadeias locais de reciclagem.

“Espera-se a ampliação das certificações e regulamentações ambientais, com maior adesão a selos de sustentabilidade, bem como a implementação de políticas públicas que estabeleçam índices mínimos de eficiência energética e de gestão de resíduos”, finaliza.

A adoção da economia circular na cadeia do concreto representa muito mais do que uma tendência: é uma estratégia essencial para reduzir impactos ambientais, otimizar recursos e promover inovação no setor.

Ao incorporar práticas como reaproveitamento de resíduos, logística reversa, uso de concreto reciclado e planejamento inteligente, a construção civil se posiciona para um futuro mais eficiente, sustentável e alinhado às metas globais de descarbonização.

O momento de transformar a forma como construímos é agora e essa mudança começa com escolhas conscientes em cada etapa do ciclo produtivo.