A concessão de empreendimentos à iniciativa privada é um dos caminhos escolhidos pelo Ministério da Infraestrutura para reverter o déficit elevado na área de infraestrutura do país. Este é um cenário esperado por profissionais da engenharia nacional, que têm uma expectativa de vivenciar um novo ciclo de aquecimento da profissão com o planejamento e execução de grandes projetos.
No começo de março, a Infra Week, semana destinada à concessão de ativos do Governo Federal à iniciativa privada, garantiu R$ 10 bilhões em investimentos, com os leilões de 28 ativos entre aeroportos, rodovias e ferrovias. A expectativa é que sejam concedidos, além desses 28, outros 22 empreendimentos, o que garantiria mais R$ 130 bilhões para o setor. Segundo o Minfra, a meta é chegar ao final de 2022 com a concessão de mais de 100 ativos e a contratação de R$ 260 bilhões em infraestrutura.
O próximo empreendimento concedido à iniciativa privada será a BR-153/080/414, que faz a ligação entre Anápolis (GO) e Aliança do Tocantins (TO), considerado o principal corredor de integração do meio-norte com o centro-sul do país. Ainda em rodovias, devem ocorrer três importantes concessões ao longo do ano: a da Dutra (BR-116/101), ligação entre o Rio de Janeiro e São Paulo, com R$ 14 bilhões de investimentos projetados, a da BR-381/262, que liga Belo Horizonte (MG) a Viana, cidade na região metropolitana de Vitória (ES), com mais R$ 7,2 bilhões, e a das Rodovias Integradas do Paraná, com mais R$ 42 bilhões.
Para o coordenador do curso de Engenharia Civil da Universidade de Fortaleza, da Fundação Edson Queiroz (Unifor), Ítalo Salomão, com o modelo de concessões sob a gestão da iniciativa privada, existe a expectativa de maior demanda de capital técnico sob a forma de incentivo à empregabilidade no setor, principalmente nas áreas de energia, portos e estradas. Ele diz que as oportunidades também são esperadas para os subsetores, que são consequência do avanço na infraestrutura do país, como os de fiscalização e controle, exigências destes tipos de obras, que têm capital sob regime misto: público/privado. “Considerando que tais subsetores são de atribuições de profissionais da engenharia, essa possibilidade gera ainda mais otimismo no que tange à geração de vagas e força de trabalho”, diz o professor.
O vice-presidente de Atividades Externas do Instituto de Engenharia, Ricardo Kenzo, concorda com a avaliação de que as concessões à iniciativa privada representam aos profissionais de engenharia uma oportunidade de crescimento e capacitação a curto prazo. Ele aponta que os novos projetos de infraestrutura podem incentivar um resgate da área de engenharia. “Segundo dados do CONFEA (Conselho Federal de Engenharia e Agronomia), de 2010 até 2019, a média de engenheiros registrados foi de aproximadamente 90 mil, em 2020 esse número caiu para cerca de 70 mil. Ou seja, a queda de 20% na formação destes profissionais é um ‘buraco’ que sentiremos daqui a 4 ou 5 anos”, diz Kenzo, que ainda acrescenta: “esta tentativa de recuperar a velocidade de retomada com a ajuda do setor privado, utilizando os modelos de concessão, aparece como uma oportunidade de resgatarmos nosso setor. E não devemos esquecer que, para um profissional ser capacitado completamente, uma década nem sempre é o suficiente”.
Construção do profissional
A formação profissional do engenheiro civil já abrange uma competência específica de conhecimento para atuar na área de infraestrutura. Entretanto, segundo Salomão, ocorre que, muitas vezes, o profissional recebe o diploma, mas ainda não tem a visão holística necessária para a dedicação a este segmento tão plural. E esse fato, somado à complexidade que uma área implica, resulta em uma baixa adesão de profissionais dedicados nesta força de trabalho.
O professor ressalta que, à medida que o segmento de infraestrutura avança, a consequência é a demanda maior de exigências de qualificações e atualizações tecnológicas do corpo técnico. “Devemos fortalecer uma sistemática de formação que trabalhe a interdisciplinaridade do conhecimento e mostrar ao aluno de engenharia que este mercado está em constante expansão, principalmente com a expectativa de aumento de vagas no setor privado ”, afirma.
Embora mais associada à engenharia civil, Kenzo, lembra que outras especialidades como a engenharia de produção, mecânica e elétrica também se beneficiam pelo impacto do crescimento na área de infraestrutura. Portanto, é essencial que as formações em todos estes segmentos cresçam no futuro. “Essas ações realizadas pelo Minfra reduzir um impacto negativo ao país nos próximos anos. Não podemos deixar a sombra do apagão de profissionais recrutar voltar ”, diz Kenzo.
Projetos de infraestrutura
A preparação e execução de grandes projetos de infraestrutura tem por característica um alto grau de complexidade. Isso porque um mesmo projeto tem uma colaboração de diversos profissionais e empresas distintas trabalhando e que precisam atuar em sintonia em todas as etapas.
“Este grande desafio traz problemas quando a comunicação não acontece de forma efetiva, ocasionando excesso de mudanças no projeto durante a construção, refletindo nos custos, no prazo e na qualidade da obra”, analisa o professor Salomão, que acrescenta ainda qual seria uma solução para superar esse desafio: “nesta perspectiva, a inserção de novas tecnologias para otimizar o processo e mitigar problemas pode ser a melhor solução para que seja criada uma nova cultura em planejamento. Dentre estas novas tecnologias, um exemplo predominante no mercado hoje é a metodologia BIM, baseada na construção virtual de todo o processo a ser executado ”, finaliza.
Em 2019 o Brasil investiu menos de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em infraestrutura, ficando atrás de economias como México, Argentina, Colômbia e Chile. Portanto, uma nova carteira de projetos com os investimentos anunciados das concessões pode significar um avanço para o setor de engenharia no Brasil.