O movimento pela industrialização da construção civil foi iniciado logo após a Segunda Guerra Mundial, com o objetivo de atender a grande demanda de reconstrução em um cenário de escassez de recursos, materiais e mão de obra. A pré-fabricação em concreto assumiu, então, um importante papel, especialmente a solução destinada a obras habitacionais que adotava o uso de painéis autoportantes. Hoje, por outras razões, como é o caso do crescimento populacional, imigração e de desenvolvimento de países emergentes, a industrialização volta novamente ao centro do palco da construção civil. Desse modo, podemos afirmar que a força motriz para a industrialização desse setor está associada aos movimentos sociais e é a única forma de promover o desenvolvimento sustentável.
E a pré-fabricação em concreto ressurge como uma das soluções possíveis para a industrialização da construção civil. E, por solução possível, entende-se aquela que seja adequadamente empregada. Aliás, a definição de um sistema construtivo adequado deve fazer parte da concepção do projeto desde os estudos preliminares da arquitetura. Ainda a respeito dessa discussão, podemos acrescentar a questão da qualidade, cuja definição que entendo ser a mais simples e abrangente é a postulada por J. M. Juran: “qualidade é adequação ao uso”.
O uso, por sua vez, precisa estar diretamente relacionado com os critérios de desempenho que devem ser estabelecidos para um determinado produto ou processo. Este último não atingirá a conformidade ou potencial requeridos caso seu “uso”, como conceito inicial do sistema construtivo, não estiver presente desde a concepção. Ou seja, as falhas de concepção invariavelmente conduzem a elevados índices de manutenção posteriores.
Falar em sustentabilidade passa também, obrigatoriamente, por esses conceitos, e é fundamental entender que há um sistema construtivo mais adequado para cada empreendimento, independente de ele ser habitacional, comercial, de infraestrutura ou industrial. É imprescindível um estudo de viabilidade que leve em consideração uma análise “custo x benefício”, pois a adoção ou não do sistema deverá levar em consideração vários fatores, tais como: a arquitetura (evidentemente que, do ponto de vista de viabilidade, é extraído o máximo potencial do sistema quando a definição pelo seu uso já está presente neste momento, possibilitando modulação e conceitos estruturais mais adequados), a logística (fator de grande relevância para a adoção de sistemas industrializados), o prazo de execução, a interface com sistemas construtivos de etapas subsequentes à estrutura, entre outros. Assim como devem ser consideradas as diversas possibilidades de uso de uma estrutura pré-fabricada, que pode ser total ou parcial, associada a outros sistemas construtivos quando necessário.
A indústria do pré-fabricado é inovadora por tradição, seja na adoção de novas tecnologias e materiais ou na adoção de princípios milenares de construção de edificações complexas, com a aplicação repetitiva de elementos simples. É esta forma simples de construir que dá respostas às necessidades atuais de rapidez, qualidade, economia, segurança e sustentabilidade. Há algum tempo, lí a respeito da construção do Paternon, em Atenas, que foi construído em 9 anos, o que para a época e considerando os recursos disponíveis e a logística envolvida foi, sem dúvida, um prazo curto. A arquitetura helênica tinha a modulação como princípio e era dominada por velocidade e inovação, segundo estudiosos no tema.
Mais tarde, em finais do século XVIII, passada a Revolução Industrial, no contexto progressista, novas formas de construir oriundas de novos materiais e tecnologias também surgiram. Na história, ainda passando por conceitos de grandes personalidades da industrialização, do modernismo do arquiteto Le Corbusier ao engenheiro e construtor italiano Pier Luigi Nervi – que, entre os anos 30 e 40 projetou estruturas com 110 x 40 metros com 6 pontos de apoio -, o concreto toma uma nova dimensão, contrariando teorias de que viria a ser substituído pelo aço.
Lendo e refletindo sobre passado, presente e futuro, percebo que inovação, modulação, velocidade, precisão, plástica, beleza e industrialização caminham juntas há milênios pela história. Não se tratam de conceitos desenvolvidos recentemente. E a industrialização no Brasil, representada entre outros sistemas construtivos, pela pré-fabricação em concreto, possui um grande potencial de desenvolvimento apesar de seus 60 anos de história.
São muitos os benefícios da adoção do sistema, entre eles a velocidade de construção, retorno mais rápido do investimento, previsibilidade, maiores vãos que propiciam maior aproveitamento dos espaços, uso racional dos recursos, alinhando a tecnologia com os preceitos da sustentabilidade e eficiência estrutural – esta última em consonância com os conceitos da arquitetura contemporânea.
Inúmeros casos reais de obras correntes e emblemáticas nos mais diversos segmentos, com uso da tecnologia, têm sido apresentados pela revista Industrializar em Concreto (www.industrializaremconcreto.com.br) .
*Íria Lícia Oliva Doniak é a presidente executiva da Associação Brasileira da Construção Industrializada de Concreto (ABCIC). Durante sua carreira, atuou em usina de concreto, na indústria cimenteira (Votorantim Cimentos) e foi consultora nas áreas de controle de qualidade e pesquisa e desenvolvimento na indústria de pré-fabricados. Foi também, ao mesmo tempo em que atuou com consultoria, auditora líder do BVQI (Bureau Veritas Quality International), tendo auditado empresas construtoras e canteiro de obras de edificações e infraestrutura em todo o Brasil. Engenheira Civil, graduada pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná em 1988, atualmente cursando o MBA–FGV em economia com ênfase em Relações Governamentais.