*Por Erika Mota
Minha primeira lembrança do universo da construção civil talvez seja comum para tantos que optaram por esta carreira: é o nostálgico jogo de montar Brincando de Engenheiro. Peças de madeira coloridas que nos permitiam construir edificações, mas acima de tudo, sonhos.
Na adolescência, a arquitetura me encantou, mas a total inabilidade artística me fez desistir desse caminho e optar pela engenharia civil. Foi nesse momento, ainda dentro de casa, que percebi o tamanho do desafio, ao ver nos olhos do meu pai preocupação genuína por ser uma área predominantemente masculina.
Os anos seguiram e essa preocupação paterna me pareceu tola. Minha turma de graduação era composta por muitas mulheres. Estagiei numa empresa com muitas companheiras e, por fim, comecei a trabalhar na ABCP com uma equipe bem diversificada.
Foi na ABCP que entendi que a construção civil vai muito além dos blocos que eu empilhava na infância, ou dos diversos conteúdos aprendidos no banco da universidade. Aprendi a importância de atuar com os diversos elos da cadeia, a compreender o valor de trabalhar em rede. Enfim, a vivenciar o então lema da empresa: “Ninguém faz nada sozinho”.
Percebi que trabalhar em um setor de tamanho impacto para o país poderia ser uma oportunidade de buscar um propósito para além da minha carreira. Tal fato coincidiu com o nascimento do meu primeiro filho e a chance de contribuir para um processo de estruturação da atuação da ABCP com os municípios, que se concretizou anos depois, com a plataforma Soluções para Cidades.
Há dez anos lidero essa iniciativa, que busca instrumentalizar gestores e técnicos municipais por meio de capacitações, conteúdos técnicos e sistematização de iniciativas inspiradoras, capazes de demonstrar o potencial das soluções à base de cimento no enfrentamento dos desafios urbanos. Qualidade e durabilidade são atributos perseguidos em cada solução, como forma de valorizar e otimizar o uso dos recursos públicos. O atendimento às necessidades da população é uma premissa.
A possibilidade de influenciar a qualidade de vida das pessoas por meio da melhoria da infraestrutura urbana inspirou a ABCP a apoiar intervenções que contribuam para o desenvolvimento das cidades e, sobretudo, inspirou a mim, como mãe, a buscar a construção de cidades melhores, mais inclusivas e humanas.
No começo dessa jornada, em que me deparei com dois desafios tão extraordinários, me permiti sonhar. Significaria contribuir para a construção de um mundo melhor para meu filho e, ao mesmo tempo, me tornar uma pessoa melhor para o mundo.
Reverberaram, então, as preocupações do meu pai. As dificuldades enfrentadas, no meu caso, não se deram por ser um ambiente predominantemente masculino e sem igualdade de oportunidades, mas porque a sociedade tem muito a evoluir no que tange ao respeito e à igualdade. Por quatro vezes, fui acolhida e sigo sendo amparada pela ABCP em minha maternidade, mas é triste constatar que isso é um privilégio que poucas mulheres desfrutam e que impacta substancialmente na possibilidade de alcançar cargos de liderança.
A participação em um projeto que uniu satisfação pessoal, oportunidade de desenvolvimento e propósito aflora um forte sentimento de realização. Mas, como ninguém faz nada sozinho, contar com mulheres potentes e homens que me respeitaram e incentivaram em toda a minha carreira, me faz pensar que obtive sucesso até aqui.
No sonho… o desejo de que tantas outras mulheres compartilhem das mesmas oportunidades.
*Erika Mota é gerente de Cidades da ABCP. Engenheira civil graduada pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Pós-graduada em Marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e especialista em gestão pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Lidera há dez anos o Programa Soluções para Cidades (www.solucoesparacidades.org.br).
Mãe do Pedro, da Laura, do João e da Mariana, está enfrentando o maior desafio da sua vida, trabalhando em home office durante a pandemia.